Abro os olhos. Na esperança vã que tudo não passou de um sonho e que tudo vai certamente ser como sempre quis e não como sonhei. Engano-me. Fazemo-lo sempre. Queremos sempre pensar que estamos desenganados, para que a vida nos dê aquilo que desejamos. Mas isso é um engano. A vida dá-nos aquilo que merecemos. Talvez mais. Talvez menos. Sempre com a capacidade de tentar balancear o possível para que não nos percamos. Ou talvez isso seja mais um engano. Não sei.
Querer não é poder. Se o fosse, todos nós viveríamos da maneira mais confortável, seríamos mais felizes, cada um à sua maneira.
Há quem tenha sonhos e não tenha esperança. Há quem tenha esperança, mas não tenha a capacidade de sonhar. Há quem sonhe uma vida inteira na esperança de concretizar os seus sonhos. Há quem tenha a esperança de um dia poder sonhar novamente com aquilo que sempre desejou.
Eu sou um sonhador. Escrever uma paixão. Não interessa porquê, nem quando, não interessa para o quê ou para quem. O que interessa sim, é que este aglomerado de palavras que se vão amontoando neste pedaço de papel, possam quem sabe, fazer sonhar novamente, tragam esperança a quem dela sente necessidade.
Há algum tempo que perdi as minhas forças, a desilusão apoderou-se de mim e deixou-me débil e incapaz de acreditar, de voltar a sentir-me esperançado na vida que, talvez um dia, me possa trazer a alegria de volta ao meu coração.
Até tenho medo do resultado desse acontecimento. Receio que se me esgotem as palavras para descrever o que sinto.
Refugio-me tantas vezes em palavras de escritores que tanto admiro porque sinto que as minhas, não são suficientemente boas, porque acredito mais naquelas que enchem folhas várias e dão cor às lombas que perpetuam na minha estante. Talvez também isso seja um engano.
Nunca tive formação em línguas, nunca soube como escrever um texto, apenas senti uma necessidade imensa de expulsar, soltar, dizer aquilo que me incomoda, desenrolar o novelo que prende estas palavras dentro de mim.
Tentei por alguns anos ser feliz sem as palavras, sem escrever. Não consegui. Enganei-me!
Não é perfeito o que digo, mas sei que se o fizer, eu sou mais feliz - pelo menos mais um pouco - e sei que, talvez num espaço ou num tempo, conseguirei fazer alguém sentir o mesmo que eu sinto quando me liberto, pois não precisamos de pés para voar. Será um desengano?
Tenho mais do que mereço, menos do que a vida me poderia oferecer. Tenho uma mulher que me ama mesmo assim, enoco, eloquente. Uma mulher que completa a parte mais importante do meu coração. Que percebe a minha infelicidade, mesmo sabendo que ela não existe, que me ouve, que me lê, que me escreve com os seus lábios nos meus, que me fala com os seus olhos para mais tarde encontrar as respostas nos meus.
A vida foi generosa demais. Consegui enganar a vida, tanto, que quando a mesma se apercebeu de tal façanha, tirou-me tudo o resto. Família e amigos à deriva em alto mar, com terra tão próxima, mas difícil de lá chegar e enquanto andar à deriva, nunca o saberei.
A vida deixou-me alguns trapos e uns trocos. Talvez para tentar perceber a maneira que descobrirei para ainda assim conseguir sonhar, se ainda assim tenho esperança e consigo manter aquilo que, tão generosamente me foi por si oferecido, embora que enganada.
Sinto que não será fácil. Estou frágil. Tropecei tantas vezes, esfolei os joelhos, pensei desistir. Fui tantas vezes enganado que sem querer me habituei à presença desses enganos e, aprendi com eles, aprendi com a vida.
Vou fechar os olhos. Vou sonhar novamente.
16.05.2014
Miguel Gonçalves
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